Descrição de chapéu Independência, 200

200 anos, 200 livros

Conheça 200 importantes livros para entender o Brasil, um levantamento com obras indicadas por 169 intelectuais da língua portuguesa

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Alessandra Devulsky

Advogada, é autora de “Colorismo” e professora do programa de mestrado em direito da Universidade de Québec

As indicações de Alessandra Devulsky

O trabalho seminal de Freyre capta narrativas portuguesas e autenticamente brasileiras para criar um nacionalismo que ainda hoje pode ser encontrado em concepções mais míticas que científicas sobre a identidade brasileira. Um nacionalismo genealógico que romantiza o patriarcalismo colonial na gênese da miscigenação racial tão comumente associada ao Brasil, mas que se encontra também na base da concepçao de nação e Estado ainda existente. Sua leitura de uma concepção unívoca de identidade nacional, embora questionável, reagia ao eugenismo arraigado no Brasil desde a colonização. A presença negra e da miscigenação deixa de ser tratada com Freyre como um estorvo ao desenvolvimento, passando a ser o elemento primordial da identidade brasileira, junto à cultura indígena. Sua tese inovadora reabilita parcialmente a cultura negra outorgando-lhe o caráter fundador da própria cultura brasileira.

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Indicações fora da lista

A obra completa de Furtado é um convite a olhar o desenvolvimento do país como um processo inacabado e permanente de emancipação iniciado no período colonial. A compreensão do desenvolvimento do Brasil de uma economia colonial para um Estado de economia periférica subordinada e dependente aos Estados de capitalismo central está no núcleo do pensamento de Furtado. Nesta obra, Furtado esboça de modo bastante vanguardista os limites da exploração dos recursos naturais dentro da dinâmica da ideia de progresso e crescimento econômico. O enfrentamento e, por conseguinte, a superação do subdesenvolvimento, no caso brasileiro, passaria assim pela imprescindível reestruturação da economia para um novo foco: o combate às desigualdades sociais.

O pensamento de Lélia Gonzalez é fundamental para a compreensão do feminismo negro latino-americano, e do lugar do pensamento crítico e radical oriundo da perspectiva de mulheres negras no panteão das grandes teorias interpretativas do Brasil. Ao consagrar a ideia de que o negro brasileiro 'não nasce negro', mas que ele 'se torna negro' em um processo de racialização particularmente violento no Brasil, Gonzalez não aparta as condições socioneconômicas e a condição de gênero do processo de construção da identidade brasileira. É na transmissão dos valores culturais negros que a mulher negra exerce um papel fundamental de 'formação de um inconsciente cultural negro brasileiro' que está na raiz da identidade nacional. A compreensão do racismo e do desenvolvimento típico de um país de capitalismo de periferia passa, de acordo com a autora, pelo necessário entrecruzamento das experiências coletivas e da observação científica encadeada pela teoria. Juntar academia e militantismo significa assim permitir que a organização social possa dar azo à libertação – o que no Brasil signfica liberar mulheres negras do jugo da 'exploração econonômica e da subordinação racial e sexual'.