No livro 'Casa de Alvenaria', cuja nova versão foi publicada em 2021, Carolina Maria de Jesus oferece uma leitura do Brasil dos anos 1960, com as suas mazelas oriundas da colonização portuguesa e da escravização de africanos e seus descendentes no Brasil. O texto revela vícios de uma vida política com seus partidos, seus candidatos e das classes detentoras do poder político, econômico e cultural que se perpetuam na sociedade brasileira. A materialidade da escrita da escritora revela ainda a luta empreendida pelos sujeitos das classes populares para se apropriarem do que se chama de norma (o)culta da língua, assim como garantirem o direito à leitura e à escrita.

O livro narra a dinâmica social de um país fictício, que pode ser lido como o Brasil dos anos 20 até o atual. O autor, ao inventar um espaço nacional qualquer, denuncia a engrenagem política de um lugar imaginário, satirizando as leis, os políticos, os favoritismos, as falcatruas, enfim, as transações da cúpula dirigente para se manter no poder. 'Os Bruzundangas' representa uma sociedade fundada pela corrupção e que tem a complacência dos bruzundanguenses, que vivem uma espécie de inércia política, deixando a situação acontecer.

A existência do Brasil é anterior à narrativa do 'ser descoberto': essa é a afirmativa defendida por Marilena Chaui na obra citada. O texto discorda da ideia de 'descobrimento do Brasil'. Para Chaui, o Brasil foi uma invenção europeia buscando conceber um 'mito de origem' para as terras apossadas. E um dos aspectos que conforma esse mito é um imaginário em que a sociedade brasileira aparece como uma comunidade nacional una e abençoada por Deus, negando o autoritarismo presente em todos os momentos da história do país.