Amazônia perde um campo de futebol a cada 25 segundos desde Acordo de Paris em 2015
Primeiro balanço do tratado internacional para conter aquecimento global será apresentado na COP28
Cerca de 83 mil quilômetros quadrados de floresta foram desmatados na Amazônia Legal desde 2015, quando o Brasil assinou o Acordo de Paris comprometendo-se a colaborar com a desaceleração da crise climática. A preservação da Amazônia está inserida em um dos principais debates da COP28.
Nesta edição, as autoridades são obrigadas a apresentar pela primeira vez o Balanço Global do tratado firmado por 195 países com o objetivo de limitar o aquecimento do planeta a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. No caso do Brasil, o cumprimento da meta depende essencialmente da diminuição dos índices de destruição da floresta.
Qual o estado, afinal, da devastação amazônica?
A região perdeu 9.001 km² de vegetação nativa entre agosto do ano passado e o último mês de julho, de acordo com os dados oficiais mais recentes do sistema Prodes, mantido pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Em relação ao período anterior, trata-se de uma redução de 22%.
A taxa ficou abaixo dos 10.000 km² pela primeira vez depois de quatro anos, resultado celebrado pelo governo Lula (PT) por quebrar esse padrão estabelecido durante o mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A gestão petista anunciou a intenção de zerar o desmate até 2030.
Por enquanto, os números seguem preocupantes. A superfície destruída foi maior do que a registrada em todos os anos de 2009 a 2018 e supera em muito a média da década passada (6.760 km²).
A área devastada no ciclo mais recente, encerrado em julho deste ano, equivale a seis vezes o tamanho da capital de São Paulo.
Já a supressão total desde o marco de Paris corresponde ao dobro do estado do Rio de Janeiro. Em ambas as comparações, o ritmo médio do desmatamento é de um campo de futebol oficial a cada 25 segundos.
Análise da rede especializada MapBiomas aponta a agropecuária como principal vetor de pressão, com ampla diferença. O impacto direto dessa atividade responde por, em média, 98,5% da degradação anual da floresta desde 2019, início da série com dados detalhados.
A área usada para criação de gado na porção brasileira do bioma cresceu 16% depois do tratado internacional, segundo mapeamento da mesma plataforma, com dados disponíveis desde 1985. Os pastos ocupam hoje 577 mil quilômetros quadrados na região, ou quase o tamanho de Minas Gerais, quarto maior estado do país.
A agricultura também teve um salto elevado, de quase 30% no período desde a assinatura do acordo. A expansão foi puxada pela soja, presente em quatro a cada cinco porções de terra cultivadas atualmente. As lavouras cobrem ao todo 72 mil quilômetros quadrados, algo próximo a Rio Grande do Norte e Sergipe somados.
Em menor escala, a mineração registrou um aumento proporcional ainda mais expressivo, tendo praticamente dobrado desde 2015. A área explorada, de ao todo 3.072 km², corresponde a quase dez vezes o tamanho do município de Belo Horizonte (MG), por exemplo.
Nesse setor, chama atenção a disparada do garimpo, responsável por 78% dos territórios minerados na região. Além do desflorestamento, a atividade quando ilegal provoca danos à biodiversidade e contaminação dos rios e lençóis freáticos, entre outros impactos graves.
Juntos, os usos do solo resultantes da ação humana aumentaram de 3% para 16% da porção brasileira da Amazônia desde 1985.
Paralelamente, a cobertura florestal recuou de 90% para 78%. Os números não são diretamente comparáveis às taxas de desmatamento oficiais do Inpe, mas indicam uma aproximação da chamada faixa de risco, o ponto de inflexão que tornaria irreversível a savanização do ecossistema.
Esse limite seria de entre um quarto e um quinto da perda da floresta primária, segundo artigo publicado em 2018 pelos pesquisadores Thomas Lovejoy, da George Mason University (EUA), e Carlos Nobre, do Instituto de Estudos Avançados da USP e do Painel Científico para a Amazônia.
Historicamente, o Brasil registrou os maiores níveis de desmatamento entre a década de 1980 e a primeira metade dos anos 2000. O combate passou a ser mais efetivo depois da instituição do Plano de Ação para Prevenção e Controle na Amazônia Legal (PPCDAm), em 2004.
Carlos Nobre ressalta o incentivo ao agronegócio no governo Michel Temer e a postura negacionista de Bolsonaro para esse resultado, mas cita também a recessão econômica de 2015 como uma das explicações para o aumento das taxas após o Acordo de Paris.
“Praticamente 90% do desmatamento é ilegal. Fiscalizar, deslocar equipes, destruir equipamentos, todas essas ações têm um custo muito alto, e o governo passou a gastar menos recursos naquele momento”, diz o cientista.
Ao avaliar o cenário atual, o pesquisador faz previsões mais otimistas. “Felizmente, tivemos um ano de redução considerável no desmatamento. Continuando essa tendência, teremos em 2024 uma taxa próxima da mínima histórica ou até abaixo", afirma.
Nos últimos meses, surgiu uma nova fronteira de preocupação ambiental: a exploração de petróleo na chamada margem equatorial, no litoral norte do Brasil, em um momento em que cientistas frisam que abrir poços não é compatível com as metas climáticas. Na COP28, ONGs e especialistas pressionaram o governo a desistir desses planos.