Descrição de chapéu Independência, 200

200 anos, 200 livros

Conheça 200 importantes livros para entender o Brasil, um levantamento com obras indicadas por 169 intelectuais da língua portuguesa

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Luciana Brito

Historiadora, é professora da UFRB (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia)

As indicações de Luciana Brito

Publicado em 1960, portanto somente quatro anos antes do golpe militar, o livro de Carolina de Jesus nos mostra que os problemas da população negra brasileira podem até ter se aprofundado depois do rompimento do regime democrático, mas desde antes a fome, a miséria e a falta de políticas públicas, além do racismo e do sexismo, já eram realidades nas periferias das grandes cidades. Carolina vivia uma realidade marcada pela fome, mas também por sua criatividade, sua poesia e sua sofisticação literária. A obra revela um outro Brasil, não aquele da democracia racial. Carolina de Jesus nos conduz para o Brasil da maioria da população, reafirmando sua incrível capacidade de descrever, analisar e problematizar o cotidiano.

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25º

Em janeiro de 1835, a cidade de Salvador foi agitada pela notícia de que estava em curso um plano de uma revolta organizada por africanos muçulmanos, escravizados e libertos. O Levante dos Malês foi uma resposta organizada da população negra islamizada ao escravismo, à violência e à perseguição religiosa. O mote maior do levante era o fim da escravidão, mas a religiosidade foi a liga que cimentou a união de pessoas negras, a maioria delas africanas, em condições distintas. O livro é fruto de décadas de pesquisa do pesquisador e historiador João José Reis que, com este livro, trouxe uma imensa contribuição na academia e fora dela sobre a agência das pessoas escravizadas e, sobretudo, sobre a resistência que empreenderam contra o cativeiro.

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33º

A trajetória da família de Eliana Alves Cruz contada no romance 'Água de Barrela' é a própria estória das pessoas negras no país desde que chegaram do continente africano, mas sobretudo no pós-abolição. Este romance histórico mistura fabulação crítica, imaginação literária negra e pesquisa histórica, além das memórias de Tia Anolina, tia-avó da autora. O livro demonstra como que, ao mesmo tempo em que o Brasil escravista conformou mecanismos de controle e exploração do trabalho de pessoas negras, elas também construíram projetos resistentes de acesso à educação, ascensão social, do direito à manutenção dos vínculos familiares e ao amor.

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33º

Publicado nos anos 1970, o livro é uma oferta (ou oferenda) de Abdias Nascimento à sociedade brasileira para a construção de um novo projeto civilizatório para o país, dessa vez a partir das demandas e propostas da intelectualidade e militância negra brasileira. Quebrando a lógica de um suposto 'problema negro', Abdias Nascimento coloca, no centro dos problemas brasileiros, os interesses, privilégios e descompromissos de setores brancos patriarcais com o grande problema do Brasil. O livro traz uma riqueza de encaminhamentos para uma sociedade igualitária em todos os campos de atuação, nos quais, segundo esse político, artista e intelectual, as pessoas negras deveriam ser protagonistas, como a política, as artes, o meio ambiente, a educação e religiosidade.

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Indicações fora da lista

Beatriz Nascimento foi uma das maiores intérpretes do Brasil, assim como foi Lélia Gonzalez. Registros do seu pensamento já foram, e continuam sendo, divulgados em outras publicações, mas destaco esta edição organizada pelo editora Filhos da África. Na obra, podemos mergulhar nas suas preocupações políticas, projetos acadêmicos e perspectivas sobre a formação da sociedade brasileira. A historiadora Beatriz Nascimento entendia a forma como a história do Brasil foi escrita como problemática, por ser restrita ao olhar dos homens brancos. Beatriz reivindica a importância de uma história escrita por mãos negras, na qual o ponto de vista da intelectualidade negra fosse reconhecida com a devida importância.

Fruto de uma pesquisa que colheu depoimentos de pessoas negras e brancas em São Paulo, de classes sociais distintas, Lia Vainer Schucman investigou como a questão da desigualdade racial é fundamental na forma como as hierarquias e desigualdades se organizam no Brasil. A partir da análise das percepções que pessoas negras e brancas, pobres ou não, têm de si mesmas, assim como dos seus privilégios e desvantagens dos lugares que ocupam na sociedade brasileira, Lia afirma o lugar da branquitude como condição de acúmulo de privilégios que forma as subjetividades das pessoas brancas brasileiras, a despeito da sua condição econômica ou gênero.

Muito se afirma apressadamente que o que difere o sistema racista da sociedade brasileira para a estadunidense é a falta de leis segregacionistas. No livro de Wlamyra Albuquerque, fruto de uma pesquisa histórica densa e análise historiográfica acurada, a autora aponta como as elites nacionais, por meio dos aparelhos de justiça e política, foram assertivamente utilizando a raça, aqui no sentido social e político, para estabelecer os níveis de cidadania a serem ocupados por homens e mulheres no Brasil pós-abolição.