Literatura e Afrodescendência no Brasil: Antologia Crítica
Eduardo de Assis Duarte; Maria Nazareth Soares Fonseca
2 indicações
Conheça 200 importantes livros para entender o Brasil, um levantamento com obras indicadas por 169 intelectuais da língua portuguesa
Luís Augusto Fischer
Professor de literatura brasileira da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
As indicações de Luís Augusto Fischer
Literatura e Afrodescendência no Brasil: Antologia Crítica
Eduardo de Assis Duarte; Maria Nazareth Soares Fonseca
Dos cinco títulos que aponto aqui, este é o menos vigoroso como livro, porque se trata de uma coletânea, e como tal carrega momentos desiguais. Mas tem o grande mérito de reunir depoimentos relevantes e artigos significativos sobre o tema do título, uma das grandes novidades no cenário da produção e da crítica literária no país. Esse tema, na área de estudos literários é farta em polêmicas, divergências e até desinteligências, mas é central na cultura brasileira, para muito além do campo literário. O livro mapeia várias das posições críticas, talvez todas as que têm relevância e transcendência em relação ao imediato. Os depoimentos, na primeira parte do livro, a começar por Adbias Nascimento, são de grande valor documental; e os ensaios oferecem largueza de perspectiva.
Ir para página do livro chevron_rightHistória do Brasil com Empreendedores
Jorge Caldeira
Autor de pesquisas muito originais, desconcertantes para o establishment historiográfico (particularmente o uspiano), Caldeira produz, neste livro, uma síntese crítica de altíssimo valor. Na primeira parte do livro, demonstra com profusão de dados que a visão historiográfica de Caio Prado Júnior deve mais à tradição corporativista, aristotélica, do que ao marxismo que alega. Daí desenvolve uma demonstração de que a lente de Caio Prado o impediu de ver elementos concretos da história econômica e social da colônia e do império que demonstrariam o equívoco de sua tese sobre aqueles momentos. Depois, expondo claramente dados de econometria e de outras abordagens empiristas, Caldeira mostra a impressionante pujança do mercado interno, ao menos desde o século 18, o que contraria a tese da dependência estrita da colônia brasileira. A tese do 'empreendedorismo' dos brasileiros, por certo discutível mas muito original e promissora, vai na contramão da visão caiopradiana, que ainda agora alimenta várias interpretações. Levado a sério, o livro deveria ter causado uma grande mudança no debate historiográfico brasileiro.
Ir para página do livro chevron_rightLiteraturas da Floresta: Textos Amazônicos e Cultura Latino-Americana
Lúcia Sá
Livro que é realmente um feito, em originalidade, profundidade e relevância, este é outro caso que deveria ter causado uma revolução nos estudos acadêmicos, mas permanece um tanto desconhecido. Nele, Lúcia Sá publica seu doutorado, que saiu antes em inglês. O estudo se estrutura em quatro grandes seções, cada uma relativa a uma das ''grandes tradições da planície amazônica que mais tiveram influência na obra de autores sul-americanos' — macro-caribe, tupi-guarani, tukano-arauaque e arauaque ocidental. Primeiro mérito: pensar o objeto por cima das fronteiras nacionais, arbitrárias se vistas do ângulo das culturas ameríndias. Segundo: abordar tudo como literatura, quer dizer, tanto os relatos colhidos por antropólogos ao longo do tempo, como as obras indianistas românticas e as modernas. A distinção entre história e mito, tantas vezes empregada pela visão ocidental, é abandonada em favor dessa abordagem mais dinâmica, mais fluente; da mesma forma, a rígida fronteira entre oral e escrito, que também estrutura o pensamento acadêmico, é arguida o tempo todo, em favor da comparação entre os diferentes textos, todos eles tratados como relevantes para compreender o tema, adequadamente apresentado no plural.
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O Arcaísmo Como Projeto
João Fragoso; Manolo Florentino
Marco de uma nova geração de pesquisadores e historiadores profissionais, este livro agrega as virtudes dos dois autores, cada um deles tendo já publicado livros de grande valor. Aqui se consolida a noção de que o controle do tráfico de escravos estava em mãos de residentes na colônia, na contramão absoluta de certezas anteriores, que atribuíam esse controle a metropolitanos. Pela primeira vez aparece de corpo inteiro o peso do arcaísmo político, configurado no Estado português (e depois no brasileiro), até mesmo sobre a economia, quebrando outra regra de ouro, agora do marxismo duro. Mais que tudo, talvez, há o mérito de mostrar que o sistema de exploração português, que é perpetuado pelo Brasil independente, se encarrega essencialmente de reproduzir as mesmas desigualdades, não apenas econômicas, mas políticas, de mando, num processo que ainda no presente é visível. Em outras palavras, o livro mostra o nexo entre o modelo da exploração portuguesa é antimoderno e se prolonga no tempo: 'nossas elites inscrevem a pobreza no mundo da natureza' (p. 236).
Metafísicas Canibais: Elementos para uma Antropolia Pós-Estrutural
Eduardo Viveiros de Castro
Publicado em francês em 2009, este livro representa um ponto de síntese do recente debate sobre a visão do mundo dos ameríndios. O autor é um dos responsáveis pela formulação original do 'perspectivismo ameríndio', junto com Tânia Soltze de Lima e Aparecida Vilaça, e neste estudo procura levar o mais longe possível a argumentação, num patamar que me parece adequado qualificar como filosófico, transcendendo a antropologia. Para isso, o estudo toma como termos de contraste noções comumente naturalizadas, como nação e razão, os quais organizam o percurso crítico para o leitor, que é um ocidental. Entre tantas pequenas e grandes chispas de inteligência, aqui se lê que na visão ocidental conhecer é objetivar, quer dizer, dessubjetivar, porque o Outro é coisa, ao passo que na visão ameríndia conhecer é personificar, porque o Outro é pessoa. As implicações de paralelos como este para o pensamento crítico são infinitas. Escrito com rigor e recheado de momentos de grande poder de iluminar a experiência brasileira e americana, o estudo clareia uma série de situações que envolvem os estudos literários, assim como a história e as humanidades em geral.