Nascida em São Francisco, Califórnia, Dian Fossey trabalhou até os 34 anos como terapeuta ocupacional, tendo inclusive dirigido um departamento em um hospital voltado a crianças com deficiência, no Kentucky.
Em 1963, aos 31 anos, Fossey juntou todas as suas economias e contraiu um empréstimo para realizar um antigo sonho: uma viagem à África. Lá, visitou o Quênia, a Tanzânia (na época, Tanganica), o Zimbábue (Rodésia) e a República Democrática do Congo (Zaire), tendo como guia o caçador britânico John Alexander.
Durante a viagem, Fossey conheceu o trabalho do zoólogo americano George Schaller, pioneiro no estudo de gorilas da montanha, assim como Louis Leakey, arqueólogo que defendia os estudos de campo de longo prazo com grandes primatas como forma de entender as raízes do comportamento humano. Leakey era o mentor de Jane Goodall, que na época realizava já havia três anos estudos com chimpanzés.
O primeiro encontro de Fossey com um gorila da montanha aconteceu durante essa viagem, enquanto acompanhava um casal de fotógrafos —Joan e Alan Root— que fazia um trabalho documental sobre os primatas em Uganda, perto das montanhas Virunga, A partir daquele momento, Fossey se convenceu a investir em uma nova carreira, com os animais.
Antes disso, no entanto, ela precisava pagar o empréstimo que havia feito para sua viagem à África. E foi o que fez, ainda trabalhando como terapeuta ocupacional.
Em 1966, Fossey voltou a se encontrar com Louis Leakey, que então estava nos EUA ministrando palestras, e o convenceu a contratá-la para um estudo de longo prazo sobre os gorilas das montanhas Virunga. Em dezembro daquele ano, ela estava de volta à África e, com a ajuda de um guia local, chamado Sanwekwe, deu início aos 18 anos de pesquisa sobre os gorilas daquela região, já considerados ameaçados de extinção.
Em 1967, Fossey criou em Ruanda, no Parque Nacional dos Vulcões, o centro de pesquisa Karisoke, que existe ainda hoje.
Os gorilas das montanhas (Gorilla gorilla beringei) têm sua população restrita a duas áreas: as montanhas Virunga —cordilheira com oito vulcões inativos cuja área é compartilhada por três nações africanas: Ruanda, Uganda e a República Democrática do Congo— e o Parque Nacional Impenetrável de Bwindi, em Uganda.
Fossey desenvolveu diversas técnicas para poder se aproximar dos primatas em Virunga e fazer com que eles aceitassem sua constante presença --muitas a partir da imitação de seu comportamento. O trabalho ganhou projeção internacional a partir de 1968, quando a revista “National Geographic” publicou uma extensa reportagem fotográfica de Bob Campbell que mostravam Fossey em meio aos gorilas.
“Tentei conquistar a confiança e estimular a curiosidade dos animais agindo como um gorila. Eu imitava o modo como eles se alimentavam e se comportavam e, mais tarde, quando eu tinha certeza do que queriam expressar, eu imitava suas vocalizações”, disse a pesquisadora em um artigo para a “National Geographic”, em 1970.
Com um dos gorilas, chamado Digit, Fossey relatou ter formado laços particularmente fortes, cortados abruptamente pela morte dele em 1977 por traficantes de animais, que arrancaram suas mãos e sua cabeça.
Os países onde ficam as montanhas Virunga eram na época, e ainda são, alguns dos mais pobres do mundo. Em Ruanda, por exemplo, mesmo hoje, apenas 8% das mulheres e 8,8% dos homens com mais de 25 anos concluíram o ensino médio (no Brasil, são 54,6% e 52,4%, respectivamente), segundo as Nações Unidas. Por outro lado, 37,8% da população de Uganda, 87,7% da do Congo e 63% da de Ruanda vivem abaixo da linha de pobreza em termos internacionais, ou seja, com menos de US$ 1,25 por dia (no Brasil, são 3,8%).
Dificuldades econômicas e a guerra civil nesses países levaram ao deslocamento de milhares de pessoas e forçaram a população local a buscar por alternativas de sobrevivência, situação que muitas vezes foi de encontro aos esforços de conservação dos gorilas das montanhas.
Os animais eram visados principalmente por seu apelo comercial no mercado internacional: na época em que Fossey trabalhou, cabeças de gorilas serviam como troféus, suas mãos como cinzeiros e os filhotes abasteciam zoológicos na Europa e nos Estados Unidos.
Além disso, os gorilas também estavam sujeitos à contaminação por doenças humanas, a armadilhas montadas pela comunidade local para outros animais, como antílopes e búfalos, e à destruição de seu habitat para a expansão da área de pasto por criadores de gado.
Contra esses problemas, Fossey muitas vezes tomou atitudes extremas e agressivas, especialmente após a morte de Digit. Segundo relatos, ela chegou a roubar e a matar o gado de criadores locais, incendiar casas, fazer ameaças de bruxaria, sequestrar crianças e até mesmo a torturar física e psicologicamente nativos suspeitos de colaborar com o tráfico de gorilas. Além disso, criticava duramente as autoridades locais pelas falhas na proteção das reservas florestais onde viviam os animais.
Com isso, ela acumulou diversos inimigos. "Fossey também foi uma alcoólatra racista que via os ‘seus’ gorilas como melhores que os africanos que viviam perto deles", disse o jornalista Tunku Varadarajan, em um artigo no jornal "The Wall Street Journal, em 2002, sobre a pesquisadora.
Em 1980, Fossey se mudou para os Estados Unidos, onde lecionou como professora universitária e organizou o livro “Gorillas in the Mist” (sem tradução para o português, de 1983), que mais tarde foi adaptado para o cinema, com Sigourney Weaver como protagonista. No Brasil, o filme ganhou o título de “Nas Montanhas dos Gorilas”.
Em 1985, pouco depois de ter voltado a Ruanda para realizar mais pesquisas, Fossey foi encontrada morta em sua cabana no Karisoke, com marcas de golpes de machado na cabeça e no rosto. O caso nunca chegou a ser solucionado, mas suspeita-se que importantes autoridades do país tenham encomendado o crime.
Apesar de controversas, as atitudes de Fossey foram essenciais para a proteção dos gorilas das montanhas. Ela criou um fundo, em 1978, em homenagem a Digit (Digit Fund, rebatizado em 1992 como Dian Fossey Gorilla Fund International), para preservar e proteger os gorilas em seu habitat natural. Com ele, recolheu doações e conquistou apoio político para aumentar o patrulhamento de reservas que abrigavam os animais.
O fundo ainda está em operação, assim como o centro de pesquisas Karisoke, dirigido desde 2012 pelo pesquisador ruandês Felix Ndagijimana. Também o ecoturismo é atualmente um aliado na conservação dos gorilas das montanhas e na provisão de recursos à população local.
Não existem censos confiáveis sobre os gorilas das montanhas. No entanto, acredita-se que hoje sua população gire em torno de 600 a 900 indivíduos. O Dian Fossey Gorilla Fund International estima que, graças ao trabalho e legado da primatóloga, a população dos gorilas das montanhas no Virunga tenha aumentado em mais de 45% desde 1989.
Muitas das ameaças que os gorilas enfrentavam na época de Fossey ainda existem. Hoje, no entanto, há ainda aquelas decorrentes da exploração ilegal de recursos naturais na região. Recentemente, o documentário “Virunga” denunciou as ações da multinacional britânica Soco para a exploração de petróleo no território das montanhas Virunga pertencentes ao Congo.
Mesmo trinta anos após a morte de Fossey, os gorilas das montanhas ainda enfrentam sérios riscos.