Habitat

um podcast sobre extinção e o que a gente tem a ver com isso

episódios da série

Avanço da cidade sobre a Mata Atlântica ameaça ave paulista

Resta pouco do bioma que já foi o segundo maior do país e hoje tem o maior número de espécies em risco de extinção

São Paulo e Salesópolis (SP)Em uma manhã de maio, sob um céu ainda escuro, saímos da capital paulista em busca de uma das espécies mais ameaçadas do estado. A menos de duas horas de São Paulo, na região de Salesópolis, vive um pássaro que não existe em nenhum outro lugar do mundo —o bicudinho-do-brejo-paulista.

Quem nos levou até um dos poucos locais onde o animal ainda pode ser encontrado foi o biólogo Luís Fábio Silveira, do Museu de Zoologia da USP. Ele foi um dos um dos responsáveis pela descoberta do pássaro, descrito oficialmente como uma espécie em 2013. As aves são o grupo de vertebrados mais conhecido pela ciência, então a descoberta de novas espécies é rara.

O bicudinho-do-brejo-paulista vive na Mata Atlântica, que já foi o segundo maior bioma do país. O ecossistema —composto de florestas, mangues e restingas-- ocupava toda a costa brasileira e, em alguns pontos, se espalhava pelo interior do território.

Séculos de desmatamento para dar lugar a plantações, mineração, pastos e grandes cidades reduziram o bioma a 12,5% da cobertura original, de acordo com dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) —com impactos nítidos na biodiversidade.

Atualmente, a Mata Atlântica é o bioma com o maior número de espécies ameaçadas de extinção. Com só cerca de 300 exemplares da espécie, o bicudinho-do-brejo-paulista é listado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade entre os animais com a maior chance de desaparecer nos próximos dez anos.

Silveira nos contou que, no passado, o pássaro provavelmente podia ser encontrado na região da marginal do Rio Tietê, na capital paulista. "A cidade veio e engoliu os brejos, retificou o Rio Tietê e bicudinho foi sendo empurrado pra cá."

Atualmente, a espécie ocupa uma área de 9 quilômetros quadrados.

Para conseguir mostrar o bicudinho paulista diante de todas essas limitações, Silveira pediu ajuda ao guia de observação de pássaros Elvis Luis de Jesus, conhecido como "Japa".

Fomos a um brejo em Salesópolis, onde o Japa nos esperava usando um boné escrito "I love birds" (eu amo pássaros, em inglês) e equipado com uma pequena caixa de som —que serviu de isca para atrair o bicudinho, com uma gravação do canto da espécie.

"Quando o macho escuta, ele vem defender o território", explicou Silveira.

O Japa tocou o canto por alguns minutos e do meio do brejo veio a resposta: um casal de bicudinhos foi se aproximando aos poucos, balançando os capins da vegetação.

Com ajuda de um binóculo, vimos os pássaros curiosos dando pulos ágeis de um lado para o outro. Macho e fêmea podem ser diferenciados pela coloração das penas: ele tem a barriga preta, enquanto a dela é branca, coberta por pintas acinzentadas.

Japa é um apaixonado pelo bicudinho, que ele descreve usando vários diminutivos. "É um bichinho tão bonitinho, discreto. Fica no meio do brejinho, escondidinho aí... quase ninguém vê, passa despercebido. Tanto é que passou bastante tempo. Passou uma vida toda despercebido, né?".

No quinto episódio do Habitat, ele e Silveira falam sobre a espécie que poderia ter desaparecido antes mesmo de ter sido descoberta.

.galeria(https://galerias.folha.uol.com.br/galerias/1711618932414713-bastidores-do-quinto-episodio-do-podcast-habitat.jsonp?callback=callback1711618932414713)

Pesquisa, roteiro e produçãoJéssica Maes e Natália Silva

Edição de textoMagê Flores e Maurício Meireles

Edição de somNatália Silva

MentoriaBia Guimarães

Edição de arteThea Severino e Kleber Bonjoan

Design e desenvolvimentoPilker, Thiago Almeida e Irapuan Campos

Coordernação de interativoRubens Fernando Alencar

Ilustrações e infografiaLuciano Veronezi

Versão impressaFernanda Giulietti e Maicon Silva

DivulgaçãoMateus Camillo e Rebeca Oliveira

ApoioInstituto Serrapilheira